7 de outubro de 2013

Motivos para a aceitação da Ação de Imissão de Posse (XII Exame da OAB 2a fase - Civil)

Caros amigos advogados e estudantes de direito!

Hoje, por pura provocação não oficial, mas com o dever formal de professor de prática processual civil, venho por meio desta postagem me posicionar sobre o gabarito preliminar divulgado pela OAB no que tange ao conteúdo da prova prático profissional (processo civil) que diz ser única e exclusiva a oferta de petição inicial de despejo para o caso apresentado. Em resumo, venho discordar.

"Jorge, professor de ensino fundamental, depois de longos 20 anos de magistério, poupou quantia suficiente para comprar um pequeno imóvel à vista. Para tanto, procurou Max com o objetivo de adquirir o apartamento que ele colocara à venda na cidade de Teresópolis/RJ. Depois de visitar o imóvel, tendo ficado satisfeito com o que lhe foi apresentado, soube que este se encontrava ocupado por Miranda, que reside no imóvel na qualidade de locatária há dois anos. O contrato de locação celebrado com Miranda não possuía cláusula de manutenção da locação em caso de venda e foi oportunizado à locatária o exercício do direito de preferência, mediante notificação extrajudicial, certificada a entrega a Miranda. Jorge firmou contrato de compra e venda por meio de documento devidamente registrado no registro de imóveis, tendo adquirido sua propriedade e notificou a locatária a respeito da sua saída. Contudo, ao tentar ingressar no imóvel, para sua surpresa, Miranda ali permanecia instalada. Questionada, respondeu que não havia recebido qualquer notificação de Max, que seu contrato foi concretizado com Max e que, em virtude disso, somente devia satisfação a ele, dizendo, por fim, que dali só sairia a seu pedido. Indignado, Jorge conta o ocorrido a Max, que diz lamentar a situação, acrescentando que Miranda sempre foi uma locatária de trato difícil. Disse, por fim, que como Jorge é o atual proprietário cabe a ele lidar com o problema não tendo mais qualquer responsabilidade sobre esta relação. Com isso, Jorge procura o advogado, que o orienta a denunciar o contrato de locação, o que é feito ainda na mesma semana. Diante da situação apresentada, na qualidade de advogado constituído por Jorge, proponha a medida judicial adequada para a proteção dos interesses do seu cliente para que adquira a posse do apartamento comprado, abordando todos os aspectos de direito material e processual pertinentes."

O problema em si não apresenta nenhum vício formal, é mesmo uma relação contratual e possessória costumeira, sobretudo, para quem milita com o direito civil em prol do interesse de pessoas físicas.

Entretanto, a OAB deve se atentar não para o problema em si, mas sim para o enunciado e, neste caso, em específico, para a questão proposta, cujo teor diz: "proponha a medida judicial adequada para a proteção dos interesses do seu cliente para que adquira a posse do apartamento comprado, abordando todos os aspectos de direito material e processual pertinentes".

Em nenhum momento a questão menciona que o direito do cliente deve ser avaliado do ponto de vista locatício. Caso assim pretendesse deveria restringir a interpretação do aluno candidato na questão formulada, o que não foi feito. 

Deveria, se fosse interesse do examinador restringir o conhecimento do aluno e a solução pretendida para o conteúdo locatício ter feito afirmações do tipo: "proponha a medida judicial adequada com base no contrato de locação", "proponha a medida judicial adequada levando em conta que seu cliente substituiu a figura do locador", "proponha a medida judicial adequada considerando o contrato existente" ou qualquer outra frase que efetivamente prendesse o aluno num único caminho de interpretação, o que não foi feito.

Além disso, o enunciado apontou o seguinte objetivo principal da ação: "para que adquira a posse do apartamento comprado, abordando todos os aspectos de direito material e processual pertinentes", ou seja, não limitou a interpretação no sentido de indicar que a solução deveria ser do ponto de vista contratual e, ainda, apontou que o objetivo é "adquirir a posse".

A questão é o que deve ser respeitado na correção. Sendo assim, o aluno candidato, no meu singelo ponto de vista, tem o direito de avaliar os fatos e nele enfatizar a aplicação da solução jurídico processual adequada, sem estar preso ao enunciado/questão que foi, em seu texto, genérico.

Desta feita, quando a questão diz que o objetivo é adquirir a posse torna-se perfeitamente cabível a ação de imissão na posse que é, justamente, "a ação do proprietário que nunca teve posse" contra o injusto possuidor não proprietário ou como geralmente acontece nas aquisições de imóveis em leilões, contra o alienante ou quem injustamente detenha a coisa.

No caso acima, não é possível ingressar com uma ação possessória, pois o cliente nunca teve posse. Mas, como proprietário que nunca possuiu, tem o direito de perseguir a coisa. Inclusive, poderia até fazer uso da ação petitória (reivindicatória).

Sendo assim, a imissão na posse, apesar de não estar atualmente prevista no CPC é aceita por parte da doutrina e pelos Tribunais. Deve seguir o rito ordinário e tem como pedido principal a entrega de coisa certa, inclusive, com pedido liminar de imissão.

No caso acima o comprador do imóvel tem todos os requisitos para ingressar com esta ação, seja ela mais demorada ou não, seja ela mais custosa ou não, de fato é cabível, e a OAB não pode ignorar isso.

Então, como de fato a questão não limitou a interpretação do aluno fica meu registro que realmente é aceitável tal petição, respeitadas todas as opiniões divergentes.

E, registre-se, apesar de o conteúdo acima ser meu olhar como professor de prática processual civil (conheça um pouco do trabalho aqui) é, também, feita como advogado que sou, atuante no campo cível.

Basta uma simples pesquisa no site do TJSP para verificar a aceitação e eficácia dessa medida em situações contextualizadas no cotidiano da prática forense real com as seguintes jurisprudências atualizadíssimas:

0139754-06.2013.8.26.0000   Agravo de Instrumento 
Relator(a): Luis Mario Galbetti
Comarca: Piracicaba
Órgão julgador: 7ª Câmara de Direito Privado
Data do julgamento: 25/09/2013
Data de registro: 04/10/2013
Outros números: 1397540620138260000
Ementa: Imissão na posse Imóvel adquirido pela autora oriundo de arrematação em leilão extrajudicial Regularidade na aquisição do bem Agravados que não comprovaram que resgatavam ou consignaram e juízo o valor do débito - Tutela antecipada para imissão na posse mantida Recurso improvido.

2018404-17.2013.8.26.0000   Agravo de Instrumento   
Relator(a): Christine Santini
Comarca: Jundiaí
Órgão julgador: 1ª Câmara de Direito Privado
Data do julgamento: 01/10/2013
Data de registro: 03/10/2013
Outros números: 20184041720138260000
Ementa: Agravo de Instrumento. Imissão de posse Deferimento em favor de adquirente de imóvel Discussão do contrato de financiamento imobiliário perante a Justiça Federal Irrelevância, por estar o imóvel registrado em nome do adquirente no Cartório de Registro de Imóveis, que, assim, detém a titularidade do domínio e deve ser imitido na posse do bem. Nega-se provimento ao recurso.

Fica, aqui, registrado meu posicionamento e um desejo (e não despejo) de boa sorte aos candidatos!

Advocacia Hoje Luis Fernando Rabelo Chacon @LuisFRChacon

26 comentários:

  1. Obrigado pelo texto! Agora resta apenas aguardar a consideração por parte da banca da Ação de Imissão na posse.
    É de se considerar também o disposto pelo § 3º do art. 273 do CPC, que diz que a efetivação da tutela antecipada observará, inclusive, as normas do 461-A, em que o juiz fixará prazo para a pessoa dar cumprimento à determinação, podendo expedir mandado de imissão na posse em caso de descumprimento, conforme § 2º do mesmo artigo. Sem falar, inclusive, que existe a possibilidade de aplicação de multa em caso de descumprimento, conforme art. 287/CPC, e parágrafos do 461..., conforme autoriza o § 3º do 461-A!

    Resta apenas aguardar o bom senso deles. Espero não ser prejudicado, pois fiz Imissão na Posse com pedido de Tutela Antecipada pelo rito ordinário, pedindo a desocupação e a imissão do Autor na posse do imóvel. Não como dizer que não atende ao fim proposto, sendo que é, inclusive, pelo mesmo rito da Ação de Despejo.

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    1. É isso mesmo! Vamos aguardar! O bom senso deve imperar, pois está claro no enunciado que as duas ações são cabíveis, devem ser aceitas e, na prática (que é o objetivo da prova) resolveriam o problema do cliente! Grande abraço e obrigado

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    2. Isso mesmo! Espero que a FGV tenha humildade para reconhecer os problemas do enunciado e, assim, não prejudicar os examinados. Utilizei a Ação de Imissão justamente porque a questão deixa claro a existência de cláusula de não manutenção da locação em caso de venda. Ora, ocorrida a venda, registrada devidamente - transf. propriedade imóvel -, cientes todas as partes e notificada a locatária sobre a venda, é claro que locação não mais existe, não figurando o adquirente como locador, tendo, portanto, interesse de agir na Imissão. Por analogia, veja-se o parágrafo único do artigo 5º da Lei 8.245. Ademais, no meu entender, o artigo 8º da Lei não está reservado ao locador, mas ao adquirente, que não necessariamente é locador ou sub-rogado, tanto que o parágrafo 2º do dispositivo prevê a hipótese para manutenção da locação, o que flagrantemente não ocorre no caso proposto. É verdade que a jurisprudência admite a Ação de Despejo para o adquirente de imóvel locado, mas nenhuma das decisões considera a maior peculiaridade do enunciado: a cláusula de não manutenção da relação de locação no caso de venda! Observem, por mais absurdo que pareça, que a FGV subtraiu justamente esta "linha" do enunciado do gabarito preliminar, não podemos concordar com tal abuso. Esperemos que consideram ambas as Ações. Movimentemo-nos!

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  2. Galera o que a gente poderá fazer, p organizar essa movimentação??? Pois, na ultima prova de tributário, foram aceitas 7 peças..portanto, nada mais justo do que aceitar Imissão na Posse, já que a questão dá azo para duas interpretações. Vamos lá!!!! Oremos, para tudo acabar bem e da maneira mais justa!!!!=)

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  3. Dr. Luis Fernando Rabelo Chacon,

    Mudando de assunto.... com as alterações do Exame da OAB, fica a minha dúvida: A primeira fase do 12° Exame será em dezembro (estou no oitavo semestre), porém a segunda fase ocorre em fevereiro (já estarei cursando o nono semestre, último ano).

    Poderei prestar o Exame ? Grato. Silvio Souza

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  4. Não consigo entender porque não caberia reintegração de posse. Se Jorge adquiriu o imóvel, adquiriu a propriedade e, no caso, a posse indireta, visto que havia um contrato de locação pendente. A posse direta estava com a locatária, legalmente, até findo o prazo para desocupação. Após isso, a posse tornou-se precária. Havendo esbulho por posse precária, caberia ação possessória. Há má fé da locatária, visto que ela foi notificada pelo antigo locador e o adquirente mas diz que não e se recusa a sair, sabendo que deve fazê-lo.
    Não tivesse Jorge obtido a posse indireta, a notificação enviada por ele seria inócua pois não lhe geraria direito algum. Se tem legitimidade para isso, logo é por ser possuidor, no mínimo. O problema não pede para discutir a propriedade do imóvel, e sim a posse. No mínimo, possuidor ele é. Findo o prazo para a desocupação, o possuidor tem direito à posse direta total, mas não pode exercê-la. A locatária perde o direito à posse direta, configurando esbulho por precariedade. A posse total é dele, mas não está com ele, e sim com o esbulhador.

    Se alguém puder me ajudar a encontrar o erro no meu raciocínio, ficarei agradecido.

    Qual é a diferença dessa questão para a questão do 107º exame da OAB/SP (ponto 3), 118º exame da OAB/SP (ponto 2), questão do 123º exame da OAB/SP (ponto 1), além do comodato?

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    1. Caro anônimo, a questão é de legitimidade processual. Só pode ser legitimado ativo na ação possessória aquele que perdeu a posse e não é o caso do problema, pois ele nunca teve posse. Ademais, não se pode presumir que a posse foi transferida pelo título translativo da propriedade, pois são institutos distintos. Quando um contrato transfere a posse isso deve ser expresso em cláusula contratual, como acontece com os financiamentos e leasings, por exemplo. Justamente, pela falta de legitimidade é que, como proprietário, portanto, tendo direito a ter posse, ele pode ingressar com ação que assim objetive a entrega, seja a imissão, seja a reivindicatória. Espero ter esclarecido,

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  5. Também fiz ação de imissão na posse por entender que o adquirente não tinha legitimidade para propor ação de despejo, ou seja, por não possuir a qualidade de locador. Quais seriam as chances reais da FGV aceitar a ação de imissão na posse?

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    1. Considerando o histórico das provas de civil e o que aconteceu no último exame finalizado, não são pequenas as chances. Mas, imprevisibilidades acontecem por aqui não é mesmo?

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  6. Questão realmente intrigante. Fiz imissão na posse por presumir que a denúncia do contrato ocorreu antes do prazo de 90 dias. Mas vejam, eu poderia ter presumido que ocorreu após o prazo de 90 dias. Ambas, repito, são apenas presunções, visto que o enunciado era silente a esse respeito. Ainda que imaginemos que a denúncia tenha ocorrido após os 90 dias, não tinhamos elementos que justificassem o despejo, pois após os 90 dias o contrato de locação prorroga-se e não sabíamos o tempo total do contrato a justificar a denúncia vazia ou cheia. Com todas as vênias, a ação mais adequada nesse vazio de informações era realmente a imissão na posse!

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    1. Obrigado professor! Eu fiz reivindicatória e pra mim está claro a sua admissão (se admitirem a imissão tem que admitir a reivindicatória), porém acredito que eles não vão aceitar...no máximo a imissão... Ass: Italo

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    2. Pq não vão aceitar? A ação é petitória e não possessória, pois, uma vez denunciado o contrato de locação (suprimido o lapso temporal de 90 dias), é evidente que não sub rogou o contrato de locação, haja vista que, como fundamentar imissão n aposse se não há previsão legal? contudo, o artigo 1228 do CC, responde que, efetivado a denuncia a locatária permanece no imóvel, e, por conseguinte, sua posse não é mais justa, e, sim INJUSTA.

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  7. Obrigado professor! Eu fiz reivindicatória e pra mim está claro a sua admissão (se admitirem a imissão tem que admitir a reivindicatória), porém acredito que eles não vão aceitar...no máximo a imissão... Ass: Italo

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  8. Professor, não há possibilidade de entendermos que no contrato de venda do imóvel estava presente a cláusula constituti, já que esta é largamente utilizada nesse tipo de contrato e já que não foi excluída pela questão? Assim, teria Jorge adquirindo tanto a propriedade quanto a posse indireta do bem, permitindo então o cabimento da ação de reintegração de posse, já que o contrato de aluguel fora extinto e Miranda praticara esbulho quando se negou a sair do imóvel? O texto da questão foi omisso quanto aos prazos do artigo 8º da lei do inquilinato e não informou se o contrato de locação era por tempo determinado ou não. Há possibilidade?

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    1. Prezado, o problema é se basear numa omissão do enunciado, o que se avalia, nas aulas sobre segunda fase, como impróprio. Não se pode presumir esta cláusula, no meu ponto de vista, pois deve ser expressa. Quanto ao prazo do contrato, concordo! Mas, a legitimidade ativa da possessória, realmente, vejo como prejudicada. Atenciosamente,

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    2. Professor, todos nós tivemos que presumir prazos e o tipo de contrato de aluguel, decorrendo daí a escolha da peça a ser construída. Qual seria a diferença em presumirmos a existência ou não da cláusula constituti. Os demais dados referidos no texto acima também foram omitidos na questão. Grato.

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    3. Qual a diferença entre presumir o tipo de contrato de aluguel, o decurso ou não dos prazos do artigo 8º, etc., e presumir se houve ou não a aquisição da posse com o registro do contrato de compra e venda?





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  9. Diante de toda a repercussão do problema verificado na prova da segunda fase de Civil do Exame XI, a OAB/FGV não teria que ter se manifestado? É normal essa demora? Os alunos que pretendem que a peça de imissão da posse seja corrigida devem se preocupar? Se a OAB/FGV manter até o dia 31/10 a ação de despejo como a única cabível, há chances de reversão por recursos individuais?

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    1. Prezado, é normal a não manifestação expressa até a efetiva correção com o gabarito final. A arma principal é o recurso individual. Mas, as manifestações coletivas agora, antes disso tudo, é fundamental para sensibilizar e motivar a discussão na própria OAB ! Vamos aguardar!

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  10. Olá Professor,


    Fiz "reivindicatória". Primeiramente, estaria correto afirmar que, no caso, "imissão na posse" e "reivindicatória" equivaleriam-se, tendo em vista que a "imissão na posse" baseia-se em direito de posse - não necessariamente a propriedade - que, no caso, era o próprio direito de propriedade do adquirente - protegido, também, pela "reivindicatória"?

    Em segundo lugar: tenho dúvidas quanto ao que alegaria em meu possível recurso. Ainda não encontrei jurisprudência, nos tribunais pátrios, que julgue caso com estas particularidades: reivindicatória - ou imissão na posse - proposta pelo adquirente em face do locatário, com a cláusula de não-renovação do contrato locatício.

    Quais argumentos deveriam ser dispostos em meu possível recurso?

    Grato pela atenção,

    Pedro Bordin

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  11. A arrogância e prepotência da OAB, assim como da FGV é muito grande, de tal sorte que devem sentir-se dignos DEUSES. Por isso, acredito que as chances de quem optou por algo diferente do gabarito por eles divulgados, não terão êxito.

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  12. É...não deu para o pessoal de imissão na posse! Alguma dica para o recurso?

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