25 de novembro de 2013

Defesa no processo civil: muito além da contestação!

Na temática da “defesa do réu” o direito processual civil, em sua teoria, nem sempre nos ensina ou nos treina para a prática, ao contrário. Advogados possivelmente viciados na visão teórica da defesa, seja pela correria do dia a dia seja por outro motivo, podem deixar passar em branco boas estratégias que estão além da “contestação”.

Por mais que o processo civil admita a chamada “contestação por negativa geral”, o que torna o momento da contestação para alguns advogados algo não tão preocupante, é certo que defender bem o interesse do seu cliente, nem que seja para uma estratégia de acordo no futuro, ou algo do tipo.

Podemos afirmar que existem três ferramentas típicas de defesa no processo civil: contestação, reconvenção e exceções. Mas, além destas, como estratégia inicial e, até mesmo, mais importante em alguns casos, lembre-se das impugnações e da ação declaratória incidental.

É tão mecânico pensar na contestação que sugiro a seguinte dica: antes de começar a elaborá-la verifique criteriosamente se existe outra hipótese, entre aquelas que apontamos logo acima. Se existir, dedique-se primeiro à ela, depois ao conteúdo da contestação.

Pense assim: contestação é o que a parte autora espera receber como resposta; é o que todo advogado faria. Então, você precisa pensar em fazer diferente, ir além, propiciando uma possibilidade real de reversão da posição confortável do autor, bem como um possível ganho de tempo ou aumento da possibilidade de uma boa negociação vantajosa para seu cliente.

Então não titubeie pensar em outras ferramentas. Isso é essencial e pode fazer a diferença no resultado prático da sua atuação na defesa. Imagine que o autor, ao preparar a petição inicial, está numa situação mais confortável do que estará o réu. Isso por que ele não tem um engessamento na elaboração textual ou de suas teses, o contrário do réu, que estará adstrito na contestação ao que foi indicado pelo autor, pois lhe caberá na contestação tão somente os fatos impeditivos, modificativos e extintivos do direito do autor. Agora, se ele pensar na reconvenção, poderá virar o jogo, poderá trazer o mesmo incomodo ao autor, forçando-o a se defender, tirando-o da zona de conforto.

E, ainda mais, se contestação e reconvenção vierem acompanhadas de alguma outra ferramenta, certamente, a zona de conforto do autor será realmente abalada. A ideia então é realizar na sua defesa um bom contra ataque. Se a contestação deve ser elaborada para frear o interesse do autor, a reconvenção deve ser utilizada para contrapor tal interesse, tornando-o efetivamente abalado a ponto de facilitar um acordo, buscar uma composição, solução esta que será, certamente, vantajosa para ambos. 

As exceções (de incompetência, suspeição ou impedimento), quando pertinentes, da mesma forma forçam o autor a sair da sua posição de ataque, gera um risco, uma incerteza, até mesmo a possibilidade de um custo maior a ser encarado futuramente para as despesas do processo. Imagine mudar um processo de Comarca, forçando o autor a gastar mais dinheiro com o acompanhamento do processo, por exemplo, com a necessidade de contratação de um advogado correspondente, etc. 

Essa visão estratégia precisa ser considerara, pois a defesa processual é sim um “jogo de xadrez”. Sem dizer que as exceções, via de regra, suspendem o andamento do processo até que sejam decididas e, em algumas situações, isso pode durar tempo e ele é fator importante, também, para forçar uma negociação vantajosa para as partes. 

No mesmo sentido, as impugnações (ao valor da causa e ao benefício da gratuidade) terão efeito pertinente para apoiar um acordo, ou no mínimo, ganhar tempo processual para que o réu se organize e, quem sabe, até mesmo cumpra com sua obrigação antes do julgamento definitivo da causa.

Além do possível ganho de tempo com o processo e fortalecimento da posição de negociação, a impugnação ao valor da causa influencia tanto no valor de possíveis custas a recolher (o que pode até impedir a continuidade da ação, com sua extinção caso não sejam recolhidas) como em possíveis honorários advocatícios sucumbenciais  (por exemplo, na hipótese de extinção do feito em virtude de alguma preliminar alegada e acatada). Então, além de retirar o autor da zona de conforto pode até trazer benefícios efetivos em favor da defesa.

O mesmo raciocínio se aplica na impugnação ao benefício da gratuidade: ganhar tempo para fazer um acordo ou até mesmo cumprir com o objeto da lide e, ainda, se o caso, forçar a revogação do benefício e exigir da parte contrária o pagamento das custas e, futuramente, a condenação no pagamento de honorários sucumbenciais.

Vale dizer que nem sempre os cartórios e o juízo conseguem verificar se o pedido de gratuidade de justiça deveria mesmo ser deferido, pois a juntada de “atestado de pobreza” para alguns juízos, nos termos da legislação aplicada, é suficiente. Caberá, aqui, então, à defesa, impugnar o benefício. Uma situação interessante que já vi é a juntada de fotos do imóvel com os carros na garagem que revelam riqueza... a apresentação de fotos do perfil público do facebook mostrando viagens internacionais ... Só de taxar o autor da ação como “mentiroso” ao pedir uma gratuidade como se fosse pobre na acepção jurídica do termo poderá certamente lhe trazer uma vantagem, pois o juiz passará a ser mais criterioso ao avaliar as informações do autor. A criatividade aqui pode ajudá-los.

Então, perceba o quanto é importante ser um estrategista, ter uma visão realmente prática (e não apenas técnica) do processo civil. Ao receber um novo caso para elaborar defesa lembre-se desse texto e vá além da contestação!

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Grande abraço e boas defesas!

Em breve, pela Editora Saraiva, lançaremos um livro sobre "gestão profissional e gestão de escritórios" para advogados! Fique ligado!


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3 comentários:

  1. Realmente, na prática, a contestação é encarada como a primeira se não a única forma de defesa do réu no processo. Não sou advogado, sou serventuário. Mas busco essa visão do advogado para entender como funciona esse "jogo". Sempre procuro o diferente nos processos e confesso que, dificilmente vejo, por exemplo, impugnação ao valor da causa ou aos benefícios da justiça gratuita. Nesse sentido, o texto é muito pertinente a nós, estudantes do Direito, que teremos que jogar o "jogo" conforme as regras, mas nunca abrindo mão das melhores estratégias que estejam ao nosso alcance. Particularmente, gosto muito das audiências. Admiro muito quando um advogado se importa em pegar a pauta de audiência para descobrir pelos sobrenomes das testemunhas se alguma daquelas pode ser parente da parte que as arrolou para, assim, poder contraditá-las. Olha que em muitos casos a estratégia deu certo!
    Parabéns, professor Chacon! Sempre trazendo um ensinamento, uma reflexão para nossa vida acadêmica e prática. Obrigado!

    Dênis L. B. Luz

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  2. Muito bom, professor! Realmente, já tive a experiência de tirar o autor da zona de conforto e ele desistir da ação, conseguir um bom acordo e até mesmo encerrá-la sem julgamento de mérito. Muitas vezes o autor não espera tal contra-ataque, não se prepara para ele e, quando ele vem, se desestabiliza e não consegue prosseguir como pretendia. Abraço!

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