8 de setembro de 2013

O futuro dos cursos de Direito no Brasil e o reflexo na advocacia.

Caros leitores,

Ontem foi “7 de setembro” e recebi uma ligação de um amigo de Brasília. Coincidência ou não, falamos sobre o Brasil, com foco no futuro dos cursos de Direito. Depois dessa conversa, decidi escrever essa postagem com conteúdo simples, mas com profunda reflexão.

Para onde aponta o futuro dos cursos de Direito no Brasil? Como ficará o Exame da OAB? Quais resultados serão sentidos após as Audiências Públicas realizadas entre a OAB e o MEC em busca de um novo marco regulatório para os cursos de Direito? Qual o interesse da OAB nesse marco? E o MEC, qual seu interesse? Existe uma tendência em favorecer a abertura de cursos das áreas de engenharia neste momento? Qual a influência que as grandes organizações societárias e investidores internacionais exercem sobre esse futuro? Como os cursinhos preparatórios se posicionam e se aproveitam deste cenário? E, por fim, naquela conversa de hoje (ontem) falamos sobre a revolução que o EAD realizou e realizará neste segmento, apontando para um formato de ensino e aprendizagem talvez bem diferente do que vivenciamos hoje e, talvez, nos próximos 5 anos muita coisa já terá mudado.

Desde o ano de 2006 até 2011 venho estudando um pouco sobre o Ensino Superior Brasileiro. Além das aulas que freqüentei no Curso de MBA em Gestão Universitária tive algumas experiências em cursos fora do Brasil (Espanha, México, EUA, Inglaterra, França e China). Sou professor universitário há mais de 10 anos e advogado desde 2000. Atuei como Coordenador de curso de Graduação em Direito e Supervisão de Cursos de Pós Graduação em Direito. Quando estive na função de coordenador nosso curso atingiu a 11ª melhor colocação entre as faculdades particulares do Exame da OAB (2011).  Em 2010 e 2012 o curso foi 4 Estrelas no Guia do Estudante da Editora Abril. As reflexões acima fazem parte deste meu cotidiano e é uma conversa de rotina entre colegas de trabalho. Até mesmo no escritório onde sou sócio nos preocupamos com esse futuro, pois impactará o mercado de trabalho futuramente e, por isso, é uma questão estratégica.

São muitas perguntas. Qual será o futuro dos cursos de Direito no Brasil? Será que o resultado do Exame da OAB vai influenciar alguma mudança? Será que a forma de avaliação que os cursos recebem do MEC vai influenciar alguma mudança? Será que o mercado de trabalho vai moldar as grades e disciplinas curriculares das instituições de ensino?
O índice médio de aprovação nos últimos Exames da OAB mostra que houve uma queda significativa nos últimos anos e a tendência é a manutenção desses números. Segundo alguns, é uma forma de controle da qualidade dos cursos, ou pelo menos, da qualidade dos bacharéis que se tornam advogados e assumem o compromisso de exercer tão nobre profissão. O Exame já foi julgado constitucional pela corte maior da nossa Justiça, então, mesmo que criticado por um grupo, deve manter esse objetivo.

Entretanto, a pergunta maior é a seguinte: o modelo atual do Exame da OAB é o ideal para filtrar os profissionais advogados que ingressam no mercado de trabalho? A segunda pergunta maior é: que influencia isso gera na qualidade dos cursos, principalmente, considerando que alunos dos últimos semestres recorrem a cursinhos preparatórios para reforçar o conhecimento jurídico e, muitos, mesmo assim, continuam não passando no Exame. Acredito que o modelo do Exame não avalia a capacidade real para o exercício qualificado da advocacia. Os cursos ficam perdidos entre se preparar para o Exame da OAB e se preparar para as avaliações do MEC, pois bem antagônicas. Ou seja, me parece que estamos perdidos, desalinhados, desencontrados e não é fácil ficar de pé numa situação destas.

O formato de avaliação dos cursos de Direito no Brasil certamente apresenta alguma falha, pois qualquer que fosse a diferença entre a avaliação do MEC e o conteúdo exigido no Exame da OAB é certo que cursos de qualidade segundo o ponto de vista do MEC deveriam atender ao mínimo de conhecimento, tal qual argumentado pela OAB. Mas, não é isso que acontece. Faculdades continuam abertas, com vagas remanescentes, sem efetivos novos cortes de vagas anunciados. E, se julgamos que o número de faculdades de Direito no Brasil é excessivo, se o número de vagas é excessivo, sobretudo, quando comparado com outros países, temos certeza que além da não autorização de funcionamento de novos cursos, o rigor na fiscalização de revalidação de cursos autorizados deveria efetivamente levar em conta fatores que, de fato, aferissem qualidade, cortando vagas e, se o caso, fechando cursos. Não é possível que continuem faculdades particulares praticando o que alguns chamam de “estelionato educacional” quando entregam um curso pífio e, depois, o bacharel fica agonizando no mercado de trabalho. Sabemos, entretanto, que os cursos de Direito são de baixo custo e alta rentabilidade, formados no que alguns apontam como ‘cuspi e giz’, a estrutura barata permite que os cursos de Direito se tornem financeiramente os carros chefe de muitas instituições de ensino, mantendo a lucratividade de tais empresas. Sem dúvida, há sempre alguma incoerência no ar quando analisamos estes fatores todos colocados acima.

Algumas pessoas defendem que o mercado de trabalho deveria servir de seleção de instituições de ensino. Contudo, considerando que o Brasil é um país em plena expansão de vagas no ensino superior, inclusive, servindo como bandeira política eleitoreira nacional e internacional, é certa então a análise de que muitos brasileiros entrarão na faculdade, mas agonizarão profissionalmente. A pergunta é se isso é justo e ético? A pergunta é se mantiver o grande número de vagas em Direito é a melhor saída, pois sabemos que algumas outras áreas seriam mais essenciais para o momento econômico do Brasil, contudo, o empresário proprietário de instituições de ensino pensa no resultado direto do seu investimento e, por isso, cursos de Direito são a primeira opção e, com isso, a bolha cresce ainda mais. Até quando?

Ouvi também outro dia que os cursos de Pós Graduação Lato Sensu teriam o objetivo de moldar o profissional para o mercado de trabalho, apresentando-lhe o necessário para a atuação prática. Contudo, lembro que muitos não passam no Exame da OAB e com isso nem concursos públicos será sua saída.  Então, serão bacharéis não empregados, não concursados, não advogados e, com isso, de que adiantaria a Pós Graduação? Além do que, sabemos, se a matéria prima dos cursos de Pós Graduação, ou seja, os alunos, tiver uma qualidade ruim, de nada adiantará, pois professores de Pós Graduação não farão milagre neste cenário. Mais uma vez, vejo que isso não funciona e, até, pode desvirtuar a Pós Graduação, tornando-a o lugar de aprendizado de conceitos e institutos básicos que deveriam vir com o bacharelado. Quem ganha com essa ideia, logicamente, novamente, os empresários e investidores que, depois da bolha da graduação, pretendem ter uma bolha nos cursinhos preparatórios, se é que já não tem, e depois, por fim, uma bolha na pós graduação. Ainda mais que a fiscalização e validação de cursos de pós graduação é bem mais simples, muito mais simples do que ocorre na graduação. Preocupação...

Faculdades ruins formam alunos ruins. O aluno não ganha com isso. A sociedade não ganha com isso. A carreira jurídica também não. De fato, se faculdades ruins permanecem no mercado é por que alguém, com poder direto ou indireto sobre isso, está ganhando. Então, analisando onde está o dinheiro, por onde ele entra e para onde ele sai, devemos ter em mente que é possível descobrir onde está tal interesse.

Voltando para a questão das audiências públicas da OAB, sobre o que dei minhas impressões pessoais e apontei as ideias trazidas no encontro realizado em SP, gostaria de ressaltar que a OAB e o MEC teem em mãos uma grande oportunidade. No meu ponto de vista, singelo, é o momento de perfilhar o objetivo do ENADE do Exame da OAB e do mercado de trabalho. Se encontrarmos uma ferramenta alinhada nestes três eixos certamente todos ganharão. Os alunos, a sociedade e as carreiras jurídicas. Talvez, investidores e proprietários de cursinhos preparatórios e seus professores perderão um pouco do mercado atual, na medida em que boas faculdades formam bons alunos que passarão no Exame da OAB com mais facilidade, sem cursinhos e estarão, efetivamente, mais preparados para o sucesso profissional. Nossa! Quem é que pode não querer algo assim? Algum aluno não gostaria disso? A sociedade não gostaria disso? Ou seja, buscando o interesse público envolvido (o tema é educação e advocacia, dois pontos relevantes para a democracia e para a sociedade como um todo), não vejo outra saída. Mas, forças podem ser destacadas para que isso não aconteça, ou seja, que continuemos com faculdades ruins, formando alunos ruins que não passam no Exame, fazem cursinho e, ainda muitos, agonizam bacharéis sem acesso à advocacia.

Bom. Acho mesmo que o Exame da OAB continuará sendo um corte neste cenário e com baixa aprovação seqüencial a partir de agora. E, aquele meu amigo de Brasília, também acha que a média será sempre menor que 25%. De cada 100 alunos ou ex-alunos dos nossos cursos de Direito somente 25 serão advogados por Exame. Enquanto isso, os outros 75 ficam matriculados nos cursinhos, mantendo o crescimento destas turmas, a venda de material didático e tudo mais. Professores animados, bons de oratória que, como o passado tem revelado, continuarão ajudando alunos a tentar alcançar um sonho, mas que só será realidade para 25% dos mesmos. Isso é bom para alunos e para a sociedade?

Não é fácil escrever isso, sobre isso, dessa forma. Muitos alunos bons, excelentes e dedicados, extremamente capacitados, independente das escolas que freqüentaram, agora freqüentam boas e péssimas faculdades e, também, independente disso, vencem muito cedo, passam no Exame da OAB, passam em concursos. Mas, sabemos que essa não é a regra. A deficiência na formação educacional do ensino fundamental e médio para a maioria dos estudantes universitários é uma barreira muito alta e, com isso, a realidade é aquela retratada acima para a maioria dos alunos. Não posso como professor e advogado, silenciar, preciso mesmo refletir e divulgar essa reflexão.

E, por fim, pensei em falar sobre a formação em EAD. Uma realidade. Para muitos, irreversível. Teremos cursos de graduação e pós graduação a distância, totalmente a distância, e cada vez mais na internet e menos no telepresencial. O celular será a sala de aula. E, o que isso trará para todos nós? Bom, uma coisa, eu sei: aquela grande massa de alunos que o governo federal pretende colocar no ensino superior vai freqüentar o ensino em EAD e com isso bateremos nossa meta de inclusão universitária. Contudo, haverá sempre um espaço para aquelas faculdades que investirem em cursos de ponta, de primeira linha, com um diferencial tremendo que será, sem dúvida, a presença do professor! Nem todos poderão pagar por isso, pois será mesmo um ensino elitizado. Os professores de hoje, também, sofrerão com isso, pois será preciso se adaptar aos novos modelos de ensino e haverá poucas vagas e muitas exigências para participar desse ensino de elite.


Enfim, são muitas perguntas. O que você acha disso tudo? Deixe seu comentário! Vamos pensar e discutir sobre o futuro dos cursos de Direito no país o que, certamente, refletirá na advocacia.

Advocacia Hoje Luis Fernando Rabelo Chacon @LuisFRChacon

3 comentários:

  1. Realmente professor, são muitas indagações.

    Bem... vamos por partes:

    O Exame de Ordem - nos moldes de hoje - certamente não é um instrumento que avalia corretamente a capacidade para ser advogado. Os cursinhos são a prova disso. São inúmeros macetes que permitem ao examinando acertar os 50% necessários na prova objetiva, e depois na subjetiva, existem as famosas "receitas de bolo" que já garantem metade do necessário para passar.
    Existe a crítica ferrenha contra o exame (por parte dos bacharéis e também por parte do interesse político de candidatos que querem se aproveitar dessa gama de eleitores).

    As faculdades realmente não preparam mais o aluno como deveriam. Doutrinas são substituídas por "resumos", "sinopses", "apostilas", "descomplicados", "esquematizados". Lógico que tais materiais tem sua importância pedagógica, mas não as vislumbro como fonte principal de conhecimento. Longe disso. E infelizmente, nas próprias faculdades esses materiais são mais utilizados do que qualquer manual "mais grosso".

    Os cursinhos se aproveitam da situação, não podemos negar. Capitalismo é isso.

    Não sei até que ponto podemos confiar no MEC, acreditando que o mesmo realmente tenha interesse na melhoria do ensino. Enem, Prouni, FIES - são instrumentos que facilitam a entrada no ensino superior, mas do que adianta se o ensino fundamental e médio continuam defasados?

    Na minha humilde opinião - de um advogado com menos de um ano de militância - acredito que o ensino jurídico deve ser introduzido desde o ensino fundamental; num segundo passo: menos faculdades e menos vagas de Bacharelado em Direito; retomada do interesse pela leitura; adoção de metodologia de estudo de caso prático; exigência de estágios mais duradouros e melhor supervisionados.

    Poderia continuar aqui escrevendo e escrevendo a opinião que venho formando desde que iniciei o curso de Direito há 6 anos atrás, mas ficaria mais monótono do que já está.

    Parabéns pelo blog Dr. Luis.

    Grande abraço.

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  2. Bom dia! É de grande importância essa matéria que o Sr. escreveu, cheguei á este texto, pois buscava uma resposta para o futuro do direito em um contexto geral, abre precedente para que tenhamos diversos modos de pensamento com relação ao capitalismo entrelaçado numa das maiores profissões desde que mundo é mundo, estudo para concurso e estou iniciando o curso de Direito, espero com muita ansiedade , que o profissional do Direito seja realmente reconhecido e valorizado como um ser de fato indispensável para uma sociedade cada vez mais justa.

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