20 de abril de 2016

SANEAMENTO DO PROCESSO E ÔNUS PROBATÓRIO NO NOVO CPC





No Novo CPC o Capítulo X (Do julgamento conforme o estado do processo), do Livro I (Do Processo de Conhecimento ao Cumprimento de Sentença), do Título I (do Procedimento Comum) da Parte Especial, em seu artigo 357, trata “do saneamento e da organização do processo”.

Imagina-se, portanto, que num processo de conhecimento, atualmente designado como rito comum (ou até mesmo poderíamos dizer, rito único, depois da extinção do rito sumário), não ocorrendo as hipóteses de encerramento do processo por acordo na audiência de conciliação, avaliando o juiz os itens postos na inicial e na defesa e não sendo o caso de julgamento conforme o estado do processo, partirá o magistrado para “sanear e organizar” o feito para as próximas etapas processuais, sobretudo, em seguida, a instrução – tornando-se imprescindível a atenção, aqui, acerca do ônus probatório, sobretudo, pelas mudanças significativas no Novo CPC.

SANEAMENTO DO PROCESSO NO NOVO CPC

Diz o artigo em comento que o juiz, em decisão de saneamento e organização do processo, deverá se pautar em cinco hipóteses, conforme seus incisos:

Art. 357.  Não ocorrendo nenhuma das hipóteses deste Capítulo, deverá o juiz, em decisão de saneamento e de organização do processo:
I - resolver as questões processuais pendentes, se houver;
II - delimitar as questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória, especificando os meios de prova admitidos;
III - definir a distribuição do ônus da prova, observado o artigo 373;
IV - delimitar as questões de direito relevantes para a decisão do mérito;
V - designar, se necessário, audiência de instrução e julgamento.

Observa-se facilmente que este artigo é bem mais complexo do que o conteúdo do antigo artigo 331, parágrafo segundo, do CPC de 1973. Realmente, permite uma melhor organização do processo, em busca de um dos princípios do novo CPC que é a simplicidade do procedimento. O juiz, em tal despacho, não terá como elaborar uma decisão padronizada, pois para atender aos itens acima certamente precisará avaliar a petição inicial, a defesa e os documentos. Somente assim poderá ele atender corretamente os preceitos acima.

Agora, inclusive, ele apontará de maneira distinta quais as questões de fatos controversos, indicará os meios de prova para resolver essa controvérsia e também apontará as questões de direito que sejam relevantes para o deslinde da demanda, ou seja, matérias de direito que serão enfrentadas para o deslinde da causa. Certamente, isso tornará mais efetiva e eficiente a instrução probatória.

Mas, para o advogado, os parágrafos que seguem do referido artigo é que são de suma importância, como veremos abaixo.

§ 1o Realizado o saneamento, as partes têm o direito de pedir esclarecimentos ou solicitar ajustes, no prazo comum de 5 (cinco) dias, findo o qual a decisão se torna estável.

O advogado deverá estar muito mais atento ao despacho de saneamento do feito, pois não poderá discutir nada do que for ali exposto futuramente, pois o parágrafo mencionado torna clara a preclusão lógica decorrente do silêncio da parte. Esse item revela também um dos objetivos do Novo CPC que é a cooperação e a construção colaborativa do procedimento, em busca da melhor solução possível em termos de boa fé, efetividade e celeridade processual. Aqui, por exemplo, o advogado de defesa do processo de conhecimento, caso tenha alegado alguma tese que não tenha sido abarcada no saneamento terá a oportunidade de corrigir este curso, sob pena de preclusão. A responsabilidade do advogado, no meu singelo ponto de vista, aumentou, pois um ato falho aqui pode gerar responsabilidade civil do profissional perante seu cliente caso o mesmo lhe traga a perda da demanda.

§ 2o As partes podem apresentar ao juiz, para homologação, delimitação consensual das questões de fato e de direito a que se referem os incisos II e IV, a qual, se homologada, vincula as partes e o juiz.

Neste segundo parágrafo estamos diante de uma grande inovação em busca de construção de um procedimento por meio colaborativo e por cooperação das partes. Exigirá, obviamente, advogados que tenham confiança, expertise e estejam efetivamente preocupados com um procedimento eficiente e eficaz. Porém, sem dúvidas, permitirá em muitos casos evitar provas inúteis, atos desnecessários, custos desnecessários, inclusive, gasto de tempo do próprio advogado. Talvez este ponto dependa de um amadurecimento do sistema e dos advogados militantes, muito mais do que uma consciência das partes em conflito. Os advogados precisam vestir a camisa de um novo procedimento, e todos sairão ganhando!

§ 3o Se a causa apresentar complexidade em matéria de fato ou de direito, deverá o juiz designar audiência para que o saneamento seja feito em cooperação com as partes, oportunidade em que o juiz, se for o caso, convidará as partes a integrar ou esclarecer suas alegações.

Aqui, maior novidade ainda, permite-se que o juiz convoque audiência específica para sanear o feito de forma compartilhada, colaborativa e cooperativa. Neste ponto, certamente, um ato processual pode economizar e muito o tempo futuro do processo, afastando pontos sobre os quais a prova não deva recair, ou permitindo acordos parciais do ponto de vista do procedimento, sempre com o objetivo de tornar eficiente e eficaz a ferramenta processual. Logicamente, exigirá e muito advogados bem preparados tecnicamente, pois aqueles que assim estiverem terão maiores chances de alcançar seus objetivos processuais nestes momentos de cooperação. O Enunciado 298 do Fórum Permanente de Processualistas Civis diz que a audiência mencionada acima pode ser marcada mesmo que a causa não seja complexa. O Enunciado 299 aponta ainda que o juiz pode designar tal ato apenas para em conjunto fixar prazos e datas visando a instrução probatória.

§ 4o Caso tenha sido determinada a produção de prova testemunhal, o juiz fixará prazo comum não superior a 15 (quinze) dias para que as partes apresentem rol de testemunhas.

O prazo pode ser menor. Certamente, entretanto, se fixará sempre nos 15 dias. Veja que o rol não é apresentado 15 dias antes da audiência, mas sim depois da intimação.

§ 5o Na hipótese do § 3o, as partes devem levar, para a audiência prevista, o respectivo rol de testemunhas.

Uma hipótese diferenciada de apresentação do rol de testemunhas, pois o advogado que for intimado para a audiência que visa o saneamento colaborativo deverá levar para o ato o rol de testemunhas que pretende utilizar como prova. Vejo que, não entregue no momento apontado, haverá preclusão.

§ 6o O número de testemunhas arroladas não pode ser superior a 10 (dez), sendo 3 (três), no máximo, para a prova de cada fato.
§ 7o O juiz poderá limitar o número de testemunhas levando em conta a complexidade da causa e dos fatos individualmente considerados.

A regra delimita o número de testemunhas e de qualquer modo, para aumentar ou diminuir o número de testemunhas, o crivo judicial é a palavra final avaliando efetivamente a necessidade de se produzir tal prova em respeito aos limites apontados. O Enunciado 300 do FPPC indica que realmente o juiz poderá ampliar ou restringir o número de testemunhas de acordo com a sua análise sobre o caso.

§ 8o Caso tenha sido determinada a produção de prova pericial, o juiz deve observar o disposto no artigo 465 e, se possível, estabelecer, desde logo, calendário para sua realização.

O artigo 465 define todos os atos preparatórios das partes para a realização da perícia, com mais detalhes do que estava antes previsto no CPC de 1973 (artigo 421). Aqui, no parágrafo analisado, veja que o juiz deve, de pronto, fixar um calendário, o que, na prática, poderá mesmo agilizar o procedimento, criando-se uma pauta fixa de trabalho que permitirá maior compromisso das partes e dos envolvidos no ato, ou seja, mais efetividade e mais celeridade.

§ 9o As pautas deverão ser preparadas com intervalo mínimo de 1 (uma) hora entre as audiências.

Imagina-se, também, aqui, um controle mais efetivo sobre a pauta. Na Justiça do Trabalho aponta-se como regra no Enunciado 151 do FPPC que as audiências de conciliação devem ser com intervalos de 20 minutos, reservando-se o intervalo de uma hora para instrução ou atos de audiência mais complexa.

DISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DA PROVA

No caput do referido artigo em análise, em seu inciso III, encontramos uma regra também muito inovadora e impactante no dia a dia do advogado. Diz a regra que o juiz deverá “definir a distribuição do ônus da prova, observado o artigo 373”.

Art. 373.  O ônus da prova incumbe:
I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito;
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
§ 1o Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.
§ 2o A decisão prevista no § 1o deste artigo não pode gerar situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil.
§ 3o A distribuição diversa do ônus da prova também pode ocorrer por convenção das partes, salvo quando:
I - recair sobre direito indisponível da parte;
II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.
§ 4o A convenção de que trata o § 3o pode ser celebrada antes ou durante o processo.

Aqui, não impera mais aquela regra fechada de que ao autor cabe a prova dos fatos alegados na inicial e ao réu a prova dos fatos contidos na defesa (impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor). Realmente, agora estamos diante de uma distribuição dinâmica do ônus da prova e esse cenário na prática poderá alterar muito a forma como os advogados deverão atuar nos processos de conhecimento baseados no Novo CPC.

De fato, segundo o artigo mencionado, as regras gerais continuam, contudo, diante da peculiaridade de cada causa o juiz poderá redistribuir o ônus probatório, criando, para aquele processo, de forma fundamentada, uma regra excepcional de ônus probatório, seja nos casos previstos em lei seja mesmo diante da peculiaridade da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos da regra geral ou então à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário por uma das partes em detrimento da outra.

Inclusive, no referido artigo torna-se claro que as próprias partes podem de comum acordo combinar a distribuição do ônus da prova, seja antes ou durante o processo. Neste caso, surge um novo assunto importantíssimo que são os “negócios jurídicos processuais”, assunto que em outra oportunidade nos aprofundaremos.

CONCLUSÃO

O saneamento do feito e a distribuição do ônus probatório no Novo CPC exigirão das partes e, sobretudo, exigirá dos advogados e do juiz, uma dedicação mais apurada, mais atenta e tecnicamente bem preparada. Imagina-se que advogados que não se preocuparem com isso poderão efetivamente prejudicar o cenário processual em detrimento do interesse de seus clientes e, por fim, obviamente, suportarão a sucumbência e, em casos mais graves, até mesmo a responsabilidade civil decorrente da falha técnica processual como tem apontado a jurisprudência dos Tribunais.
 
 


Advocacia Hoje Luis Fernando Rabelo Chacon

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