Na temática da “defesa do réu” o
direito processual civil, em sua teoria, nem sempre nos ensina ou nos treina
para a prática, ao contrário. Advogados possivelmente viciados na visão teórica
da defesa, seja pela correria do dia a dia seja por outro motivo, podem deixar
passar em branco boas estratégias que estão além da “contestação”.
Por mais que o processo civil
admita a chamada “contestação por negativa geral”, o que torna o momento da
contestação para alguns advogados algo não tão preocupante, é certo que
defender bem o interesse do seu cliente, nem que seja para uma estratégia de
acordo no futuro, ou algo do tipo.
Podemos afirmar que existem três
ferramentas típicas de defesa no processo civil: contestação, reconvenção e
exceções. Mas, além destas, como estratégia inicial e, até mesmo, mais
importante em alguns casos, lembre-se das impugnações e da ação declaratória
incidental.
É tão mecânico pensar na
contestação que sugiro a seguinte dica: antes de começar a elaborá-la verifique
criteriosamente se existe outra hipótese, entre aquelas que apontamos logo
acima. Se existir, dedique-se primeiro à ela, depois ao conteúdo da
contestação.
Pense assim: contestação é o que a parte autora espera receber
como resposta; é o que todo advogado faria. Então, você precisa pensar em fazer
diferente, ir além, propiciando uma possibilidade real de reversão da posição
confortável do autor, bem como um possível ganho de tempo ou aumento da
possibilidade de uma boa negociação vantajosa para seu cliente.
Então não titubeie pensar em outras
ferramentas. Isso é essencial e pode fazer a diferença no resultado prático da
sua atuação na defesa. Imagine que o autor, ao preparar a petição inicial, está
numa situação mais confortável do que estará o réu. Isso por que ele não tem um
engessamento na elaboração textual ou de suas teses, o contrário do réu, que
estará adstrito na contestação ao que foi indicado pelo autor, pois lhe caberá
na contestação tão somente os fatos impeditivos, modificativos e extintivos do
direito do autor. Agora, se ele pensar na reconvenção, poderá virar o jogo, poderá
trazer o mesmo incomodo ao autor, forçando-o a se defender, tirando-o da zona
de conforto.
E, ainda mais, se contestação e
reconvenção vierem acompanhadas de alguma outra ferramenta, certamente, a zona
de conforto do autor será realmente abalada. A ideia então é realizar na sua
defesa um bom contra ataque. Se a contestação deve ser elaborada
para frear o interesse do autor, a reconvenção deve ser utilizada para
contrapor tal interesse, tornando-o efetivamente abalado a ponto de facilitar
um acordo, buscar uma composição, solução esta que será, certamente, vantajosa
para ambos.
As exceções (de incompetência,
suspeição ou impedimento), quando pertinentes, da mesma forma forçam o autor a
sair da sua posição de ataque, gera um risco, uma incerteza, até mesmo a
possibilidade de um custo maior a ser encarado futuramente para as despesas do
processo. Imagine mudar um processo de Comarca, forçando o autor a gastar mais
dinheiro com o acompanhamento do processo, por exemplo, com a necessidade de
contratação de um advogado correspondente, etc.
Essa visão estratégia precisa
ser considerara, pois a defesa processual é sim um “jogo de xadrez”. Sem dizer que as exceções, via de
regra, suspendem o andamento do processo até que sejam decididas e, em algumas
situações, isso pode durar tempo e ele é fator importante, também, para forçar
uma negociação vantajosa para as partes.
No mesmo sentido, as impugnações
(ao valor da causa e ao benefício da gratuidade) terão efeito pertinente para
apoiar um acordo, ou no mínimo, ganhar tempo processual para que o réu se
organize e, quem sabe, até mesmo cumpra com sua obrigação antes do julgamento
definitivo da causa.
Além do possível ganho de tempo com
o processo e fortalecimento da posição de negociação, a impugnação ao valor da
causa influencia tanto no valor de possíveis custas a recolher (o que pode até
impedir a continuidade da ação, com sua extinção caso não sejam recolhidas)
como em possíveis honorários advocatícios sucumbenciais (por exemplo, na hipótese de extinção do
feito em virtude de alguma preliminar alegada e acatada). Então, além de
retirar o autor da zona de conforto pode até trazer benefícios efetivos em
favor da defesa.
O mesmo raciocínio se aplica na
impugnação ao benefício da gratuidade: ganhar tempo para fazer um acordo ou até
mesmo cumprir com o objeto da lide e, ainda, se o caso, forçar a revogação do
benefício e exigir da parte contrária o pagamento das custas e, futuramente, a
condenação no pagamento de honorários sucumbenciais.
Vale dizer que nem sempre os
cartórios e o juízo conseguem verificar se o pedido de gratuidade de justiça
deveria mesmo ser deferido, pois a juntada de “atestado de pobreza” para alguns
juízos, nos termos da legislação aplicada, é suficiente. Caberá, aqui, então, à
defesa, impugnar o benefício. Uma situação interessante que já vi é a juntada
de fotos do imóvel com os carros na garagem que revelam riqueza... a
apresentação de fotos do perfil público do facebook mostrando viagens
internacionais ... Só de taxar o autor da ação como “mentiroso” ao pedir uma
gratuidade como se fosse pobre na acepção jurídica do termo poderá certamente
lhe trazer uma vantagem, pois o juiz passará a ser mais criterioso ao avaliar
as informações do autor. A criatividade aqui pode ajudá-los.
Então, perceba o quanto é
importante ser um estrategista, ter uma visão realmente prática (e não apenas
técnica) do processo civil. Ao receber um novo caso para elaborar defesa
lembre-se desse texto e vá além da contestação!
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além da teoria, aprende a pensar o processo em favor do seu cliente.
Grande abraço e boas defesas!
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