9 de fevereiro de 2011

Estagiários de Direito podem fazer café no escritório?

Queridos leitores,

 No sábado passado, dia 5 de fevereiro, aproximadamente 150 pessoas estiveram presentes no III Workshop da Casoteca Direito Unisal Lorena (www.casoteca.com). Alguns alunos da graduação tiveram o prazer de participar do referido evento, apresentando, mesmo que rapidamente os seus estudos de caso.

Dentre os assuntos tratados um deles é relevante para a advocacia, para a formação de novos profissionais do Direito. O case indicado para as turmas de Pós Graduação em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho e em Direito Civil e Processo Civil, acabou por repercutir no interesse de todos os advogados contratantes e alunos contratados como estagiários. O case, denominado: Obrigado por existir estagiário!, foi apresentado com o objetivo de explorar o seguinte aspecto da relação de estágio: os escritórios de advocacia ou mesmo os órgãos públicos que contratam estagiários de direito respeitam a legislação em vigor? As Instituições de Ensino Superior estão empenhadas em participar ativamente da relação contratual de estágio como prevê a nova legislação?

Pessoalmente achei o tema de extrema relevância e conteúdo muito complexo. Exige de nós operadores do Direito, professores universitários em Instituições de Ensino Superior em Direito e, contratantes de estagiários, uma boa reflexão.

Passo, portanto, a provocá-los!

1 - O estagiário de direito que é contratado para fazer cafézinho no escritório onde estagia, organizar o arquivo morto e pagar custas no Fórum, está adequadamente recebendo as informações necessárias ao aprimoramente profissional complementar aos seus estudos?

O estagiário de direito que na área pública se restringe ao atendimento no balcão ou na autuação de documentos está adequadamente recebendo as informações necessárias ao aprimoramento profissional complementar aos seus estudos?

Além disso, é sabido que, sobretudo, no interior dos Estados, o contrato de estágio é, muitas vezes, celebrado informalmente, de maneira verbal, sem que seja redigido o instrumento adequado, sem que seja garantido ao estagiário o mínimo que a legislação prevê. Ele não tira férias compatíveis com o calendário escolar, não tem redução de carga horária, não tem seguro de vida etc.

Se tais fatos exemplificativos são possíveis irregularidades contratuais, o que devemos fazer? Qual a atitude inicial que se espera do profissional do Direito, seja advogado, juiz, promotor ou delegado em relação aos alunos bacharelandos em direito que contratam?

Por outro lado, qual deve ser a conduta das faculdades de Direito? Sabemos que segundo a nova legislação que regulamente o estágio a Instituição de Ensino não é mera coadjuvante, mas deve participar da relação contratual de estágio e garantir ao aluno que os objetivos do mesmo sejam alcançados.


2 - Entretanto, não é só a questão da irregularidade contratual que devemos observar. Mais importante do que isso é a realidade fática vivida pelo estagiários, pois o que para muitos pode soar como irrelevante para o aprendizado do aluno de Direito, para outros, pode soar como estritamente necessário.

Vejamos, por exemplo, a Gestão de Escritórios de Advocacia. Irregulares ou regulares os contratos de estágio convocam para dentro de sua equipe alunos de faculdades de Direito. Fazer café, organizar prontuários, organizar a agenda, atender telefonemas, organizar o arquivo morto, autar documentos etc., é também atividade do profissional do Direito? Acredito que sim. Mesmo que não esteja inserido dentro das disciplinas das grades curriculares dos cursos de Direito, o aluno precisa conhecer a realidade do ambiente de trabalho. Se o advogado contratante realiza - ou realizou durante muito tempo - referidas atividades, o estagiário deve aprender como se faz!

E, pensando na advocacia, sobretudo, o aluno tem que conhecer realmente a rotina do escritório, reconhecer nessa rotina a característica do dia a dia do advogado que é, muitas vezes, profissional liberal, dono do seu próprio nariz. Saber controlar sua agenda, organizar as contas e o fluxo de caixa etc. Ou seja, precisamos quebrar um paradigma: estagiário de direito, sobretudo, em escritórios de advocacia não pode querer somente lidar com processos judiciais ou atendimentos a clientes ou ainda pesquisas jurisprudenciais, precisa fazer café, controlar a agenda, pagar contas etc., pois essa é a realidade do dia a dia da maioria dos advogados.

E não fiquemos só na advocacia: um juiz de direito não precisa conhecer nada de gestão? E como fica a organização do seu cartório, dos seus recursos humanos, estruturais e tecnológicos? O estagiário da magistratura não deve estar atento a esse aprendizado? Não deve tentar desde o estágio compreender como se organiza e gerencia um cartório, como se delegam funções aos subordinados?

A Faculdade de Direito do Largo São Francisco anunciou recentemente que pretende incluir a disciplina de Conciliação em sua grade. É só um exemplo de inclusão de matérias diferenciadas visando uma formação ampla do aluno. Do mesmo modo, incluir atividades outras aos estagiários pode ser tão engrandecedor quanto.

3 - Conclusão: se podemos hoje facilmente justificar a inclusão de disciplinas não jurídicas nas grades das faculdades de Direito, fica claro que podemos justificar também a inclusão de atividades não jurídicas aos estagiários de Direito, visando prepará-los para a realidade que encontrarão no mercado de trabalho.

Os abusos contratuais e os abusos da mão de obra barata devem ser repelidos, hoje e sempre, mas o aprendizado de atividades não jurídicas é enriquecedor!

O que você acha?

Advocacia Hoje Luis Fernando Rabelo Chacon www.cmo.adv.br

7 comentários:

  1. De fato, esta postagem faz jus ao nome deste blog, Advocacia Hoje, uma vez que o tema da postagem é super atual e é fruto da transformação social que nossa sociedade hoje enfrenta.
    Como já foi objeto de postagens minhas e de outros colegas, o profissional do direito, tem sido, dia após dia, intimado – para fazer uso de expressões da classe – a conhecer, conhecer só não, dominar várias áreas do conhecimento humano, digo dominar, já que não basta saber que existem é preciso aplicar as mesmas várias vezes no decorrer do dia.
    O assunto é muito complexo que não me atreveria e nem tenho a pretensão e conhecimento para sobre o mesmo tecer comentários que versem sobre todas as causas e conseqüências dos mesmos.
    Porém, fazendo um paralelo, vejo nesta questão a mesma celeuma do trabalho infantil, explico, antigamente as crianças “trabalhavam” com seus pais, fato que muitas efetivamente trabalhavam como adultas, mas numa regra as crianças no seu processo de crescimento acompanhavam várias atividades realizadas pelos pais e as realizavas pouco a pouco, até dominá-las por completo no decorrer do tempo.
    Certamente estas crianças não imaginavam que varrer um quintal, servir uma visita, colocar roupa no varal, ajudar no cuidado com os animais, dentre outras viriam a lhe ajudar no discernimento e na vida profissional, mas certamente, se perguntarem aos adultos que cresceram sobre este cenário, hoje dão valor àquelas atividades.
    Uma colocação se faz mister, SOU CONTRA O TRABALHO INFANTIL, como advogado pauto sempre pelo bom senso, uma vez que o Estado não está como sentinela vigiando a todos, embora seja sua função, o bom senso, é em minha opinião a melhor norma de uma sociedade.
    Deste modo, tal qual as crianças, o estagiário, com o devido respeito, deve vivenciar todas as atividades de um escritório, e vivenciá-las, todas, em intensidade, buscando sempre qualidade e aprimoramento, com bom senso, pois sairá do estágio com bagagens em várias áreas que certamente farão diferenças seja para abrir seu escritório, seja para surpreender com sua competência e domínio das atividades e postura em uma banca de renome.
    As crianças sem as atividades acima aprenderão mais tarde algo que já poderia vir, como dizem os antigos “do berço”, assim, o estagiário deve ser vanguarda e dominar tudo o que puder, pois acredite, fará a diferença.

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  2. Caro Professor Chacon, me inteirei acerca da matéria exposta, já que trata de assunto primordial aos nossos alunos, principalmente, aos estagiários, com os quais temos mais contato, no NPJ. Muito interessante o abordado e precisamos realmente difundir o assunto. Dra. Zeima

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  3. Assino embaixo. Acho que os profissionais que contratam estagiários devem cumprir tb o papel de ser humano, ensinando e viabilizando a humildade no próximo. Pois afinal, servir café, atender telefone e etc, não diminui a competencia de ninguem!
    Valorizo a humildade das pessoas.... acredito que isso seja um grande fator para o sucesso!!
    Parabens Chacon!

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  4. Acho que o que mais incomoda o advogado que contrata o estagiário fora de todos os critérios legais (carga horária, "férias"/recesso, seguro de vida, contrato com a faculdade etc.) é saber que, embora possa estar proporcionando um bom estágio, está muito fora da lei, está ilegal!

    Embora aqui no Brasil convivamos com a ilegalidade nas pequenas coisas com muito tolerência (sonegação de impostos, favores políticos, falsos atestados médicos, pore xemplo) ninguém gosta de ser chamado de ILEGAL. Especialmente alguém que viva das leis, não é?

    O primerio passo é reconhecer que estamos ferindo a lei sobre estágio, para, então, tentar buscar a adequação aos direitos do estagiários, como o seguro de vida.

    Abraços,

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  5. Gostei muito, desde cedo tem que aprender sim que a Advocacia é mais ampla que o Direito, ou que peticionar e audiências.

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  6. "Fazer Café!? Acredito que sim!"
    É, façamos um estágio para cozinheiro então ( não desmerecendo a profissão!).
    Creio que o estágio deve complementar a vida acadêmica, e, se o advogado fez o tal cafézinho, na minha opinião, tratou-se de um erro que não devemos perpetuar!
    Cabe ao estagiário, auxiliar nas matérias concernentes ao direito, e não, matérias que seria uma função de um empregado!
    Mas, claro, entendo que nem todos podem arcar com a contratação de um estagiário e um empregado no escritório, então que se escolha este último!

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  7. Inicialmente, enfatizo minha aquiescência quanto ao argumento ventilado pelos colegas no sentido de que é imprescindível no estágio a plena observância da multidisciplinaridade. Realmente precisamos extipar essa visão já totalmente ultrapassada que recai sobre a forma como se prepara o acadêmico de direito para a vida profissional.

    Não obstante isso, gostaria de tecer algumas críticas sobre o caso, pois entendo que o assunto assume, ao mesmo tempo, dois importantes vetores e que, por via de consequência, acaba por gerar uma resultante. Esta, por sua vez, a depender das atitudes tomadas pelo profissional, poderá ser positiva ou negativa.

    Primeiro: Infelizmente, e assim ratifica claramente o senso comum, o escopo do profissional ao exigir do estagiário a feitura do café ou de quaisquer outros afazeres que não se liguem ao seu aprendizado rotineiro não é o de aperfeiçoá-lo para a vida. Aliás, poucos são os que, exigindo isso do acadêmico, têm por objetivo desenvolver nele a simplicidade ou quaisquer outros atributos importantes para o convívio em sociedade. A grande maioria, na verdade,visa com isso evitar outros gastos. Isso passa a se tornar tão rotineiro, tão habitual, que o ensino jurídico fica em segundo plano, prevalecendo as exigências menos importantes para o acadêmico. Não fosse isso, então respondamos o porquê de tantas condenações por desvirtuamento e fraudes nos contratos de estágio.

    Segundo: Mesmo que a mentalidade dos profissionais mude, ainda assim é preciso que algo mais também se modifique, isto é, a própria legislação. Ora, de nada irá adiantar um profissional querer exigir do estagiário a feitura do café, da extração de cópias ou do pagamento de contas se a legislação diz que isso é desvirtuamento do contrato de estágio. No final, haja vista o caráter protetivo da leislação trabalhista, a condenação será clara. (veja-se lei 11788/08, art.9º CLT etc)

    Portanto, seja para resguardar o estagiário de maiores decepções ou o profissional de possíveis condenações, tenho por mim que ainda não estamos preparados para utilizar dessa multidisciplinaridade com o intuito do benefício mútuo. Falta-nos, ainda, certa ascensão no campo da moralidade, visto que o "jeitinho brasileiro" ainda prevalece, bem como mister a readequação da legislação trabalhista.
    Sem isso, de rigor observar o que determina a legislação!

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